Coluna: Não se nasce escritora, torna-se escritora©

Telma R. Ventura
6 min readDec 10, 2021

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* 6 hábitos diários que vêm minando suas possibilidades de se tornar escritora

Todas as professoras de escrita literária, escrita criativa, escrita afetuosa e tantas outras escritas falam sobre diversos hábitos e técnicas a serem desenvolvidos; mas nenhuma se refere aos hábitos que as mulheres que estão se desenvolvendo na vida da escrita devem parar de ter. Ou correm o risco de jamais atingir seu objetivo.

Ao invés de deixar em definitivo esses hábitos, muitas mulheres podem tão-somente reduzir a frequência, ou mesmo tentar uma rotina diferente da que estão acostumadas. Será que funciona? Vejamos.

Eu elenquei seis hábitos sabotadores. E elaborei seis sugestões de mudanças que podem, genuinamente, fazer da rotina das mulheres que escrevem uma caminhada mais leve.

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1. Redes sociais

Eu costumava passar horas nas redes sociais. Já deletei meus perfis no Facebook, e nunca tive uma conta no Twitter. Ainda faço uso do Instagram (e só dele), mas apaguei o aplicativo do meu celular e o utilizo pelo notebook. Por que deletar do celular? Porque, sempre que me via distraída, acabava por rolar a tela e olhar o que as outras pessoas estavam postando. E, nesse ato de olhar a vida alheia, eu levava horas! Sem perceber, saber da vida alheia estava tomando o meu tempo. De escrita. Pois, ao invés de fazer o que eu mais queria fazer na face da Terra — me tornar uma escritora — , eu estava me tonando... uma voyeur do sucesso alheio.

Imaginem: esse hábito estava tomando o meu tempo e me deixando frustrada pois, no fim do dia, eu não havia escrito nada! Mas não pensem que foi fácil o que eu fiz: muitas pessoas (muitas mesmo!) me cobram, até hoje, pela minha ausência nas redes sociais. Além disso, várias vezes, eu me sinto alienada. Mas lembro que postagens de redes sociais não é vida real, e me acalmo.

Redes sociais, hoje? Uma vez ao dia, três vezes por semana: ao invés de veneno, tornou-se remédio. Para estar em contato, para divulgar e para me distrair. Com moderação.

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2. Escrever ao invés de ler

Que coisa mais estranha de uma escritora dizer, não é? Não, não é: durante as minhas tardes, eu costumava sentar à minha mesa, abrir o notebook e (tentar) escrever as tais 500 (ou até 1000) palavras que muitas(os) professoras(es) de escrita dizem que devemos escrever. Diariamente. Eu sou verdadeiramente apaixonada pela escrita, mas aquilo não estava funcionando.

Sabem o porquê? Porque essa situação estava me levando ao extremo da ansiedade. Nem todas as pessoas funcionam bem sob pressão; tampouco escritoras produzem (ou devem produzir) por demanda. Comigo, aconteceu que eu me sentava na cadeira do escritório (afinal, é importante “ser profissional”…) e não conseguia criar nada!

Então, eu troquei a escrita de 500 a 1000 palavras ao dia pela LEITURA de 500 a 1000 palavras por dia. Sabem o que aconteceu? Tornei-me muito mais produtiva. E feliz.

A leitura nos leva a ter ideias, a ter insights de escrita. Além de ser uma hábito que (a mim, pelo menos) relaxa. Eu escrevo (no sentido “profissional”) há alguns anos, mas sou uma leitora voraz desde menina. Aliás, um bom livro me leva de volta à infância, e me faz resgatar a criatividade dessa fase.

Mas um alerta: a leitura que nos traz ideias e capacidade de criação é a leitura extensiva e atenta; “ler um livro numa sentada” (para ler 20 livros em um mês…) é das coisas mais improdutivas (e, desculpe a sinceridade, estúpidas) que uma mulher que quer ser escritora pode fazer.

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3. Checar no Google?

Eu não sou uma millennial; portanto, nasci antes — muito antes… — de existir Internet, Whatsapp, o tio Google. Eu aprendi a ligar um computador com mais de 20 anos… Então, ficar checando informações no Google, para mim, não é um hábito inato. Mas eu o adquiri, e ele estava acabando com a minha paz criativa.

Porque, ao invés de nos entregarmos — nível subjetivo, emocional — ao enredo de um filme ou série, por exemplo, ficamos o tempo todo buscando informações — nível racional, objetivo — a respeito dos atores e atrizes, datas, roteiristas. Essa atitude quebra todo o processo criativo que poderia se processar em nosso cérebro (ou alma, como queira) ao nos envolvermos com a obra artística.

O que eu faço, agora? Desligo o celular e ocupo minhas mãos com outra coisa, enquanto assisto o que quer que seja: eu anoto. Lápis e papel. Desenho, até. Esboço ideias. Isso me ajuda a focar tanto no filme/série quanto criar novas narrativas no meu papel. E, se eu tiver alguma curiosidade a respeito de algum ponto específico do filme/série, anoto — e procuro no Google depois que o que estou assistindo termina.

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4. Estar sempre em busca do tal engajamento…

OK — eu também uso as redes sociais para divulgar o que escrevo. Ou seja, também gosto de números: os likes nos meus posts do Instagram, o número de visualizações e curtidas nos meus vídeos do Youtube. Quantos inscritos eu tenho na minha newsletter. Números contam para uma escritora.

Mas essa contagem estava me tornando uma miserável. Primeiro porque o meu trabalho é na área das Letras, e não no Marketing e/ou Vendas; segundo, contar é ranquear — ou seja, comparar. Comparar o seu “sucesso” (entre aspas, já que eu questiono o que é “ter sucesso” na vida) com o “sucesso” alheio. E, nas redes sociais, tudo é virtual — inclusive a verdade.

Ser melhor que as outras ou ser bem-sucedida para mim mesma: o que é mais importante na minha carreira de escritora, afinal?

Por isso, troquei a fixação nos números pela network. As redes sociais, a rigor, objetivam conectar as pessoas. Assim, agora, eu ignoro os números — meus e das outras — e estou criando uma comunidade de escritoras. Como? Eu replico postagens interessantes de outras escritoras, converso pelo DM, respondo a todos os comentários (no Instagram e no Youtube), criei uma newsletter especial e exclusiva para quem me segue, e ando buscando ver as outras mulheres que escrevem — que, portanto, tentam a mesma travessia que eu — como parceiras de jornada. Não mais como competidoras.

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5. Mexa-se!

Vou ser direta: movimentar-se faz de todo ser humano alguém mais ativo.

Nós, escritoras, trabalhamos sentadas. Que outro jeito?

Mas eu, particularmente, penso melhor enquanto ando, por exemplo. Ou quando danço. Tomo minhas melhores decisões, organizo o pensamento.

Além de desestressar por liberar endorfinas, o movimento — aquele que lhe fizer bem, sem fórmulas prontas — nos deixa mais felizes, mais saudáveis, com maior poder de criação. Pulem, dancem, andem, mexam-se! Movimento é liberdade.

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6. ASAP (as soon as possible)

Responder mensagens. No Instagram, no Whatsapp, no Telegram… o uso da comunicação por texto é muito, mas muito conveniente. E rápido. Mas gera pressão e tensão quando é imbuído de imediatismo.

Vivemos no mundo do imediatismo. E as mensagens vêm se tornando um inconveniente para quem, como nós — mulheres que escrevem — quer desacelerar para poder criar. Eu mesma, muitas vezes, leio as mensagens chegadas pelos diversos aplicativos e esqueço de responder. Resultado? Ou a pessoa que enviou pensa que eu estou brava, ou que eu a estou ignorando. Para tal ideia se formar na cabeça dela leva… 3 minutos!

A ansiedade é a doença do século — muitos diziam que era a depressão mas, após a criação das redes sociais… Para reduzir essa tensão, esse imediatismo na minha vida, o que eu fiz? Reduzi o número de grupos dos quais participo no Whatsapp e, nesse mesmo aplicativo, desabilitei o “visto por último” e a confirmação de leitura. Verifico o Telegram duas vezes por dia.

Agora, tanto as outras pessoas quanto eu — já que eu também, por anos, fui acometida do imediatismo da resposta — somos livres para nos comunicarmos quando sentimos falta uns dos outros.

(As suas mensagens? Vou responder assim que possível ;) )

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Eu sei… mudar os hábitos leva tempo

Nossas vidas são como nossos velhos e bons guarda-roupas: para termos onde colocar peças novas, precisamos criar espaços novos. Como? Jogando fora o que não nos serve mais.

O que é mais importante para você: ser escritora ou usar as redes sociais?

Use suas novas roupas.

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Telma R. Ventura

Psicóloga & Psicanalista • Escritora • Tradutora • MA em Crítica Literária • ✍🏼 A VOZ DA ESCRITA